Não inventei estas histórias que me sussurraram

As paredes estavam pintadas de branco. Assim acordei. E desde o despertar, comecei mais uma sina; mais um dia, diriam-nos os leitores das auto-ajudas desajustadas, vendidas nas lojas que não entro; e nas quais nunca farei crediários. Me recuso a tal feito! Os corredores eram estreitos neste lugar, no entanto. Não menos largos que os personagens cujo diâmetro, aqui, tem dois raios, e para quem os corações são cirurgicamente maltratados pelo que se chama de vida; para outros ingenuamente morte.

Eu vivia. E tendo já acordado, com os pulmões cheios de ar, respirei profundamente. Vi os cenários circundantes. Maravilhado, ou apenas ignorante em relação aos assuntos irrelevantes, iniciei uma conversa com meu amigo.

— E ai Rafa, como andam as coisas?

— Estão as mesmas, lembra? Estão do jeito que nós deixamos ontem.

De alguma maneira, as conversas se construiam espontaneamente.

— Lembra daquela mulher de quem te falei. Era esposa minha. Desde que terminei com ela, e fato que te anuncia as minhas angústias em relação ao despreendimento sobre o feminino, tudo mudou. A minha visão sobre as coisas me faz pensar, e ver que talvez eu ame outra mulher amanhã. Talvez eu me case outra vez. Ignore as estatisticas dos divórcios. Talvez eu seja simplesmente outra pessoa da qual quis me esquivar.

— Entendo o que você fala. E sou solidário a isso. Só não sei se irei aplicar suas máximas, ou os seus erros que se apresentam como acertos aparentes.

— Provei meu ponto de vista.

— Como assim?

— Mostrei que posso estar errado.

— Se eu te admirar pelo seu argumento, encontrarei mais belezas nos ensinamentos errantes. Vejo isso. Mas, ainda assim, pemranço em postura conservadora. Mantendo meus hábitos, minhas persistências em ter meu patrimônio, em acrescentar à minha propriadade, me sinto como se justificasse coisas superficiais. Será que perdi o gosto pelas propriedades? E sei que, se bem li John Locke, eventualmente, descobri a extensão desta propriadade pelos meus própios membros.

— Coloque em versos isto. Dará uma música.

— E para quem eu irei cantá-la?

— Não sei, talvez para os ouvidos mais necessários.

— É?

— Sim, digo que sim. Eu, por exemplo, estou te escutando.

Engraçadamente, essas conversações se desenvolveram entre amigos, na mesa do bar. A espuma do cálice da bebida dourada, em bolhas de gás carbônico, transbordavam pela extremidade do recepiciente. As bocas beijavam o alcool, e as falas faziam tudo sorrir. Logicamente, eu sorria também neste movimento. Pessoas desconhecidas, e já aconchegantes. Ciencia estranha esta, de prover hipóteses para um discurso inédito.

No shopping, onde se escrevem estes devaneios, as mulheres olhavam as vitrines. Elas possuiam um vidro muito translúcido. Todos os produtos se observavam, nítidos. As pequenas pedras de bijouteira, ou de diamante extraído dos chifres de elefantes, compunham as geometrias perfeitas de tais pedras preciosas. E estas mulheres não se davam conta disso, mas queriam compulsivamente o adorno.

Na praça de alimentação, na mesa onde estavámos, ouvi uma risada de fundo. Com surpresa, o som provinha da minha própria mesa. Eis que, tendo me dado conta, notei-me rindo com meus compatriotes recentes de cerveja.

Não obstante este momento, continuei andando. Não inserido como numa perigrinção sem fim, como eu seu precisasse de profetas para saber que posso explorar outros mundos. Despedi-me, então, e fui embora; mantendo na memória a saciedade de ter consumido humores honestos.