Caça às pérolas

Quando acordei, eu não estava em Estado nenhum. Sem Estado, portanto, não havia estado de direito, nem lei que me subjugasse a qualquer ordem. Entretanto, ao olhar para frente, um oceano sobrepujava meus pensamentos, arrematando-me para sua ordem, sua lei de admiração. As ondas vinham tão eloquentes em minha direção; impossível não curvar minha cabeça a elas.

A areia estava gelada. Em um dia de inverno, são assim os grãos da areia mais cálida. Sobre assento frio, desse modo, prossegui com minha inércia acalorada. Na praia deserta, sem humanos a ocuparem a visão, senti-me como o último dos observadores do crepúsculo. Um solitário que acena para o alvorecer, aguardando o falecimento do dia. “Depois, com sorte, ele nascerá de novo”, pensei.

Enquanto o dia brincava comigo, percebi que a alternância de chuvas e sóis era oscilação necessária. Na primeira chuva, avistei, em princípio, uma sereia no mar. Ela surgiu num salto ornamental entre duas ondas. Molhada pelas águas oceânicas, e adornada pelos pingos que vinham do alto, ela saltou, sorriu, e foi embora. Tivemos determinada comunicação. Como nos contatos sisudos de um dia chuvoso, ela ofereceu-me olhar oblíquo. Saltou. E seduziu-me, uma vez no alto, na melhor altura. Depois, submergiu; parecia querer beber mais água.

Parou de chover, de repente. Fique com sede. Aquela água que caia antes não alimentava a secura do meu espírito. Ele estava encharcado, porém com sede. Pus-me a andar, em virtude disso. Nossa, minha língua maltratava a boca. Era instrumento que lambera a visão de uma sereia, secara-se, e permanecera ausente de líquido.

Dez quilômetros de caminhada na direção direita, logo após, pude recompor-me.

— Ei! – gritei, acenando em sua direção. – Estou aqui!

Ela não olhou. Parecia precisar antes dos raios de sol, para que depois pudesse reluzir em mim. Descondirei o fato que de que não sabia nadar. Tirei minhas roupas. Queria sentir a aderência da água colando ao meu corpo. Sem saber muito como fazer, bati as pernas e os braços. Meus braços cansaram-se primeiro. Depois foram minhas pernas. Que ser inalcançável! Contudo, sem desespero, boiei em inércia para frente. Flutuei cada metro em bom som, porque são assim as boas ondas. Formam-se irreparáveis no horizonte, para colidirem-se com os corais na costa, ilustrando o advento da formação, e a beleza do choque.

Depois de trezentas braçadas, encontrei-me sozinho naquele mar de águas. Não tinha forças para retroceder. Por conseguinte, continuei nadando. Uma vez tendo adentrando no oceano Pacífico, eu teria uma longa jornada na subida rumo ao norte. Por que acima? Califórnia. Meu objetivo era a Califórnia; desbravaria um novo continente como Jedediah Smith.

Fortunadamente, peguei carona com o La Ninã. Que frio senti, todavia eu precisava de velocidade. Queria chegar logo à Califórnia. Assim que o fenômeno climático findou, vi-me, novamente, em jornada solitária. Iria durar pouco, no entanto. Já tendo aprendido a nadar antes, com braços e pernas agora experientes, era possível vencer todos os recordes aquáticos.

Eu andava, sublime, sobre a tensão superficial da aguá. Tão delicadas eram minhas passadas, eu não afundava mais meus pés. Era o sinal de que minha experiência encontrara a correta caminhada. Sim, pés no leito do oceano. Não era absurdo para mim. De anfíbio, transformei-me em réptil nadador. Depois, na próxima escala da evolução, postei-me em pé, na água. Finalmente, abdiquei da vida molhada, e comecei a voar. Ela ainda estava no oceano. Mas, se ela assim tão profunda existia, talvez eu devesse muito alto voar. Quando ela pusesse sua cabeça na superfície, de novo, querendo respirar, eu precipitaria uma tempestade lá dos altos.

Eis que ela surgiu. Assim que tomou o ar em suas brânquias encantadoras, quis de novo desvanecer. Assoprei, lá do alto. Em seguida, abaixei minhas asas, e declinei-me em vôo rasante. Sem perceber, apanhei-lhe com minhas garras macias. Voltei ao alto. No cume dos ventos, na mais alta das massas de ar, sorri, satisfeito. Eu havia furtado a mais bela pérola do mar. Abri sua concha, retirei a pedra preciosa, e levei-a, comigo, para o alto da ionosfera, onde se comunicam as ondas de rádio da felicidade.

Autor: Lucas Vinícius da Rosa