Vozes

Alice in Chains - Voices (Sound Cover)
Alice in Chains – Voices (Sound Cover)

Quantas e quantas vezes atirar-me foi preciso, dentro dos meus abismos, para despertar-me da ilusão da queda. Porque como uma criança que a tudo deslumbra, porém deixa que seus pais lhe coloquem a blusa do uniforme colegial dentro da calça, e lhe dê, com um tapinha nos ombros já encurvados, um leve empurrão em direção às muralhas da escola, escutava sempre eu as vozes de professores que me faziam imitar os que estavam à minha frente; e dessa maneira nunca aprendi a escutar a minha solidão; ouvir as deliciosas e por vezes arriscadas vozes que ressoavam retumbantes dentro de meu crânio em plena e prodigiosa expansão.

Assim nunca soube discernir o que era real. Praticava o homicídio culposo da individualidade. E criminalizava a beleza das minhas imperfeições e defeitos pueris, porque enxergava no ideal dos gregos e romanos, meus colegas e espelhos próximos, exércitos de soldadinhos que não eram reais e jamais poderiam sê-lo, ao passo que só faziam repetir abrir e fechar portas sem trancas ou fechaduras.

E ninguém se entendia, assim como ao sair à rua hoje adultos mal se compreendem em suas realidades tiquei-taque, ainda que combinem cumprimentos forçosos e elogios que anseiam, gritam, por elogios em retorno. E assim seguem-se, um por um, numa aclamada ordem régia, imprescindível à Hobbes — o medroso –, para que atravessem o sinal verde os carros sem que se choquem, e seres humanos não sejam atropelados como cães negligentes.

Eis que, quando corajosamente escarrei na moralidade dos homens ditos de boa moral, revelando minha covardia primeiro a mim e depois ao mundo, esculpi na existência feita de areia um monumento suntuoso e imperial, com base apenas em meu pensamento revolucionário, a arrebatar as pernas de argila dos conceitos velhos e repugnantes, estourando-me no meu peito a verdade que se posicionava além do bem e do mal: sonhar é livre e ninguém poderá nisso lhe copiar: daí suas quedas de seus mergulhos próprios e abissais serem sempre ilusórias. Ironicamente, sonho mesmo de olhos abertos; neste instante, escrevo este escrito quilômetros de altitude altivo.

Autor: Lucas Vinícius da Rosa