Se meu pensamento falasse

Resolvi, de súbito, escrever tudo, aqui, o que não poderia viver de outra forma. Eis que tal vislumbre, ou se diria pensamento, veio-me inquieto enquanto minhas pálpebras não se fechavam. Alguns chamariam tal fenômeno de inspiração, e eu apenas de vergonha na cara literária. Me postarei a narrar, agora, os argumentos dos que, se mentiram, não vim a saber que assim o faziam; o que se descreve vem da cabeça, e se narra na velocidade em que aparece; como fez James Joyce, em Ulisses. Não leu? Então tome “la vergonha em su cara” e vá ler algo decente, meu amigo. Não conhece Hunter S. Thompson, nem Jack Kerouac, os que escreviam enquanto pisavam na estrada? Ah, você não vive no mesmo século que eu, certamente.

Embora no Brasil, vejo que as estradas estão se encurtando por aqui. As mentes jovens estão já velhas. E apáticas se mostram as faces as quais gostaria de idolatrar. Ora, sem heróis ou deuses aos quais gastar o joelho, ponho-me apenas a escrever. Não por estar preso, ou condições assim que impõe o indivíduo a se expressar enclausurado; faço tal narrativa por vontade própria, sem ter conhecido o ferro da grade que prende, e vendo o sol que surge e se põe para todos.

Vi uma velhinha dia desses, acho que foi ontem ou anteontem. Ela tinha um sorriso faceiro em seus dentes. E como adorei ver aquela sinceridade perante a vida. Não obstante, caminhava eu com a minha mãe, e esta aparição me foi fortuita. Minha mãe conhecia a dita senhora. E nos aproximamos todos. Ah, que abraço eloquente me fora ofertado. Meus ossos foram estrangulados, e meu coração se confortou. Minha mãe olhou, admirou a cena, e percebeu nunca ter ela outrora estrangulado seu filho desta forma. Disse eu à mulher: “que abraço bom!”. Eis que ela tratou de me dar outro igual, outro estrangulamento, em consequência de meu comentário. Sorri outra vez.

São assim as caminhadas da vida, espero. Eventualmente você está com sua mãe, ou com sua namorada (ainda que eu não a tenha) e lhe vêm outra pessoa, recheada de outras sensações de vida. Ou a ampulheta da existência decorre o tempo, e com o cair dos grãos de areia vêm os sucessos de seus amigos não mais vistos, ou de seus conhecidos agora arranjados. Veja bem, seu espelho sempre parecerá mais impactante, embora todos tenhamos superfície que reflete em casa.

Esses dias eu me exaltei, e errei com quem não deveria. Depois, quando fui pedir desculpas, tal como um cão que mete seu rabo entre as pernas, me senti esquisito. Não pelo erro, nem pela desculpa. Mas pela situação. Ocorre que pressenti o mesmo erro, do mesmo jeitinho, e resolvi não pedir as desculpas sabendo repetir seu motivo. Fiquei quieto, e todo mundo sobreviveu.

Há um violão ao meu lado. Tentei extrair dele determinados sons, e me fazer músico outra vez na vida. Não alcancei sucesso, e achei que minha reprodução lírica, esta, era melhor que a intenção musical. Matutei sobre como inspirado fora Noel, o poeta da vila, ou Gonzaguinha; violeiros de melhor estirpe que a minha, que só faz escrever delírios até não sonoros.

Se Cazuza estivesse vivo, aliás, com certeza trocaria uma ou duas conversas comigo. Tomaríamos um conhaque Presidente, e conjugaríamos o pais à merda! Tudo poesia, coisa de poeta, ora. Como é este apenas um devaneio, nem Victor Hugo ou Dostoiésvki hão de me salvar, mesmo porque fora um o advogado das prostitutas, e o outro o escravo da Sibéria.

Pensei, vou escrever um soneto. Ou uma poesia maior. Quem sabe um conto, ou uma crônica. Mas ai pensei nos meus amores perdidos, nas minhas mortes faladas, e em como é perverso respirar. Me convenci do contrário, dado isso. Ainda que no final do túnel, iluminada pela chama última, que ilumina sem saber o porquê, viera-me a imagem deste escrito — chamo de pura criatividade, ou puro pensamento, vai saber.

Autor: Lucas Vinícius da Rosa