Carregado pela mão da vida

Ela pegou a mão do seu filho. Eles caminharam, então. Os corredores, por onde percorriam com seus pés de mãe e ingenuidade de filho, eram torturantes a cada pegada. Estavam no térreo deste prédio de concreto estranho. E o pavimento era moderno, quase falsamente transparente, como as vitrines das lojas nas quais não compramos.

Sua mãe, à medida que chocava-se contra a história dos próprios corredores, segurava firmemente a palma da mão de seu filho. Era como se não quisesse que aquela impetuosa história, escravagista e sufocadora, atingisse seu filho; como um Brás Cubas, cujo legado medíocre da civilização não quisesse que fosse trazido à seu filho.

Seguiram os dois pelo suposto passeio educador. Mas, educação havia menos no olhar da mãe, e mais no semblante do filho; neste instante, ele aprendera que a escravidão antiga é, hoje mesmo, presente. As paredes grossas do museu, ou praticamente um mausoléu, traziam a imaginação infantil para um patamar horrível.

Sem sorrir, as grades de uma prisão, agora transformadas em museu, eram incólumes colunas para seu próprio pensamento. Na fachada do prédio, fora erguida um placa, emoldurada em prata, cujos dizeres dizem qualquer coisa condecorada, menos a escravidão vista pela criança.

Nesse ambiente inóspito, mas mais urbano e cotidiano que qualquer outro ambiente, este infante cresceu. Perto do limiar da sua personalidade, ele desenvolveu nojo do morto, da vida urbana já morta, e também do desenvolvimento moderno que sequer lhe pertencia.

Quando, no banho, olhou pelo parapeito da janela, embasbacou-se. Por vezes, ao olhar por esse mesmo parapeito, ele vira um vaso de flor falecida. Eis que, contrário até à sua imagem das ruas nas quais caminhava, viu o vaso de flor sorrir, ou florir, com uma poesia partida da amônia ou nitrogênio do solo. Bactérias do seu estômago morreram antes, mas apenas ao preço de ressurgirem pelo próprio florescimento, daquela mesma for que o mortificou; sim, aquela vasinho de flor trouxe outros galhos; e eles eram até bonitos.

Enfim, mãe filho, aquém do banheiro onde lavaram suas almas, continuaram sua caminhada. Há muito tempo, até conforme fora ensinada a história a este escritor, tudo fora tortura. Contudo, ainda que fizesse cócegas na alma da mãe, e trouxesse sorriso à criança, ambos padeceram. È que em meio a jornada, houve um contratempo. A vida veio-lhes rasteira, e assim lhes interrogou; sim, interrogação da própria vida.

— Por que está levando minha mãe? Já não basta levar meu pai? Já não basta, no final, me levar também?

A vida nunca lhe respondeu. Como jamais respondera à qualquer ser humano. Talvez, por especulação, esta mesma vida tenha feito alguns escritos, como este que compôs o diálogo de uma vívida escrita, ainda que sobre a morte. Depois, sobraram apenas alguns rabiscos.

Acho que, sem ser órfão, houve milhares de crianças existenciais sem saber sobre a existência. Daí eu ser imbecil sobre minha própria, curta, intensa, até fajuta, estadia aqui!

Autor: Lucas Vinícius da Rosa.